quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Teologia da Inversão - Parte I

O que é inversão? Inversão é o ato ou resultado de mudar ou mudar-se; alterar a ordem, o estado das coisas. Veja agora o significado de inversão em cinco ciências: (1) Linguística. Alteração da ordem comum ou direta dos elementos de uma frase; anástrofe. (2) Economia. Ação de aplicar ou investir certa quantia (dinheiro) com o propósito de obter lucro ou ganho; investimento. (3) Anatomia. Anomalia observada em algumas vísceras cuja posição se apresenta em sentido contrário àquele considerado normal. (4) Eletrônica. Ação de converter uma corrente unidirecional em corrente alternada.O que tudo isso tem a ver com teologia?
Teologia é a ciência que estuda a divindade e seu relacionamento com o indivíduo e o universo. a teologia bíblica é a ciência ou disciplina que trata da revelação de Deus (IAVÉ) e sua intervenção na história, conforme apresentado nos relatos bíblicos, a fim de cumprir o seu propósito por intermédio de Israel e culminando na encarnação do Seu Filho, Jesus, o Messias.
Então, o que vem a ser essa teologia da inversão? Será uma nova teologia que irá revolucionar o pensamento cristão? Ou será mais um daqueles modismos teológicos já "manjados"?
Bem, essa teologia da inversão não é algo novo. Teologia da inversão é o que a igreja vem fazendo já há alguns séculos, cujo marco oficial foi a igreja imperial do século IV com o imperador Constantino em Roma. Muito do que a igreja fez de lá pra cá não foi outra coisa senão inversão.
Muitos já citaram alguns exemplos de inversão. Você pode lembrar de "templocentrismo", "domingocentrismo", "sacerdotecentrismo", e outros "ismos" aí. Isto é, aquilo que antes era secundário, como o local de adoração, tornou-se principal. O essencial, a adoração a Deus, ficou limitado a um espaço "sagrado". O tempo para adoração ficou limitado a um dia na semana, onde Deus desce aos domingos nos templos para distribuir bênçãos aos seus fiéis. Ah, e o "sacerdócio universal de todos os crentes", um dos lemas da Reforma Protestante? Tornou-se uma bela teoria pouco praticada desde então, hoje em proporções ainda maiores, quando observamos em muitas denominações o culto à personalidade do líder-fundador da igreja (não Cristo, é claro!).
Ao longo da história da igreja a inversão tem predominado em diversas áreas tanto na teologia como na práxis eclesiástica. A Reforma do século XIV rompeu com Roma, contribui na elaboração da doutrina da salvação (salvação somente pela graça), mas manteve as estruturas medievais. Somente no século XV movimentos minoritários começam a clamar por uma "reforma radical". Liberdade religiosa não foi conquistada por Lutero e seus contemporâneos reformadores. Anabatistas, separatistas, batistas, estes e outros "istas" sentiram na pele a espada dos Estados protestantes. Na Reforma mudou-se o conteúdo mas a forma, ainda carregava muito do modelo eclesiástico medieval.
Pós-reformadores, porém, não satisfeitos com o produto inicial da Reforma, e percebendo o quanto ainda poderiam avançar com o ideário reformador hastearam a bandeira com o lema "Igreja reformada sempre reformando está". A Reforma não satisfez plenamente as mudanças necessárias na eclesiologia e teologia. Muito ainda precisava ser realizado. A Reforma (ou as reformas) não poderia parar em Lutero, Calvino e seus contemporâneos. Reforma na igreja deveria ser ato contínuo.
Bem, a Reforma iniciada por Lutero na Alemanha (resultado de todo um pano de fundo sócio-político-econômico-religioso iniciado no século XII), assim como os movimentos radicais na Europa Continental e na Inglaterra, passaram e deixaram herança nas diversas denominações protestantes: credos, confissões de fé, compêndios teológicos, estruturas eclesiásticas, patrimônio material, e muito mais. No entanto, todos esses empreendimentos não impediram o processo da inversão teológica, ao contrário favoreceram ainda mais essa tendencia.
A erudição bíblica do século XVIII e XIX provocou um afastamento considerável da fé em direção a uma religiosidade pautada nos princípios da razão. A Bíblia foi alvo de severas críticas: crítica da forma, crítica da redação, críticas e mais críticas teceram afim de sustentar as teorias vigentes. O racionalismo e o evolucionismo começavam aí a minar as estruturas da sociedade direcionando o pensamento humano a atender os novos paradigmas. A teoria documental de Julius Wellhausen  disseminou a tese de que o Antigo Tetamento foi formado por cinco tradições diferentes que compuseram o texto bíblico: Javista, Eloista, Deuteronomista e Sacerdotal (Priestly). Essa teoria acabou enfraquecendo e até anulando a autoridade das Escrituras.

Continua...